terça-feira, 9 de abril de 2013

Biografias não autorizadas e o Direito das Celebridades


*Artigo publicado em: http://www.piccininiserrano.com.br/blog/


Biografias não autorizadas e o Direito das Celebridades


Tramita no Congresso Nacional um projeto que busca tornar desnecessária a autorização para publicação de biografias de celebridades. Nesta terça-feira, dia 02/04/13, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 393/2011 [1], do deputado Newton Lima (PT-SP), que altera o Código Civil — Lei 10.406/2002 – dando nova redação ao seu artigo 20. O projeto visa a “garantir a liberdade de expressão, informação e o acesso à cultura na hipótese dedivulgação de informações biográficas de pessoa de notoriedade pública ou cujos atos sejam de interesse da coletividade”.
Atualmente, a legislação só permite a divulgação de informações biográficas, de qualquer cidadão, em publicação na forma de livros ou filmes que sejam devidamente autorizados pela pessoa envolvida, ou seus sucessores, bem como nos casos de necessidade da administração da Justiça, ou manutenção da ordem pública.
Caso o projeto seja aprovado, a ausência de autorização passará a não ser fator impeditivo para a publicação de imagens, escritos e informações, cuja finalidade seja biográfica, de pessoa com trajetória pessoal, artística ou profissional de dimensão e notoriedade pública.
Com base na vigente redação do Código Civil, alguns casos notórios, envolvendo a publicação de biografias não autorizadas, se destacam nos Tribunais pátrios, como é o exemplo dos casos envolvendo as biografias não autorizadas de personalidades como o cantor Roberto Carlos; o compositor Vinicius de Moraes; os jogadores de futebol Garrincha e Pelé; e o pintor Di Cavalcanti.
Apesar do nobre objetivo do Projeto de Lei 393/2011, em fomentar a liberdade de expressão e o acesso à cultura, não se pode concordar que as personalidades públicas, entendidas como políticos, esportistas, artistas, entre outros, pelo fato de serem pessoas com trajetórias profissionais e pessoais de destaque, tenham seus direitos de personalidades flexibilizados, a ponto de perderem a gerência sobre as publicações das suas próprias imagens.
Importante frisar, a propósito, ser absolutamente temerário confundir os conceitos de imagem-retrato eimagem-atributo das celebridades, como ocorre na justificação do Projeto de Lei 393/2011, a ponto de se afirmar que a imagem de celebridades tenha se confundido com a sociedade, e, em outros termos, tenha se tornada pública.
Em termos de Direito à Imagem, aliás, a jurisprudência pátria há muito solidificou entendimento no sentido de distinguir a imagem-retrato das celebridades, que é aquela atinente à intimidade da pessoa, em sua vida privada e familiar, daquela que se passou a chamar de constructopersona ou imagem-atributo, que é o conjunto de atributos de uma pessoa identificados no meio social.
Assim, por exemplo:
 “Dessa maneira, podemos afirmar que existem duas imagens no texto constitucional: a primeira, a imagem-retrato, decorrente da expressão física do indivíduo; a segunda, a imagem-atributo, como o conjunto de características apresentados socialmente por determinado indivíduo. (A proteção constitucional da própria imagem, Ed. Del Rey, Belo Horizonte, 1996, p.31)” [2].
Ou seja, a imagem de uma celebridade, conforme a Doutrina e a Jurisprudência atual assinalam, possui, no mínimo, duas vertentes: a imagem como pessoa natural, imagem retrato; e a persona, personagem, imagem constructo ou imagem-atributo.
Conforme assinala Denis Barbosa, a imagem-atributo representa a “exteriorização de um constructo que não se identifica com a pessoa natural”, uma vez que resultante de árduo trabalho no sentido de garantir uma imagem pública notória [3].
Entretanto, a imagem-retrato de uma celebridade, na maioria das vezes, encontra-se no âmbito da privacidade e intimidade desta pessoa, que não deseja ter sua vida exposta ao público, além daquele limite imposto, como um ônus, pela exploração econômica da sua imagem-atributo.
Em todo o caso, a imagem de qualquer pessoa, celebridade ou não, encontra-se no âmbito dos direitos de personalidade da pessoa humana, que são inalienáveis e não passíveis de sofrer limitação, como cláusula pétrea da Constituição Federal.
Não se mostra crível sustentar que uma celebridade não possua gerência sob sua imagem, com base no argumento de que a notoriedade, ou o interesse público, bem como qualquer outro direito fundamental, limite o direito à privacidade e intimidade destas pessoas célebres.
Extrapolando os limites da imagem das celebridades, forçoso reconhecer que qualquer pessoa humana representa diferentes personas em sociedade, vida familiar, profissional, afetiva, etc., cabendo a própria pessoa humana a gerência da sua imagem entre estes diversos âmbitos. Ninguém se resume à sua imagem profissional, mas é formado pelo conjunto destas.
Assim, na condição de direitos de personalidade que são, não se pode concordar com a flexibilização do direito à imagem das celebridades, como se a notoriedade fosse um ônus tal que extinguisse, por completo, o direito de personalidade atinente a publicação da imagem, como resta estampado no  Projeto de Lei 393/2011.
[1] Projeto de Lei 393/2011 – http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=840265&filename=PL+393/2011
[2] STJ, Resp. 578.777, Terceira Turma, Ministro Relator Humberto Gomes de Barros 24 de agosto de 2004.
[3] BARBOSA, Denis Borges. Do Direito de Propriedade Intelectual das Celebridades. Disponível em 24/02/2013, às 15h.:  http://www.denisbarbosa.addr.com/arquivos/200/propriedade/pi_celebridades.pdf : 2011.
 *Escrito por Maurício Brum Esteves

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